ESPECIAL 50 ANOS DO BI: O LEGADO TÁTICO DA EQUIPE DE 1962

20/06/2012 11:23

 

A Seleção Brasileira de 58, dirigida por Feola, conquistou o mundo postada num 4-2-4. O aludido desenho tático surgiu com o objetivo de criar dificuldades para o W-M europeu. Assim, um volante virou o 4º zagueiro, e um dos meias se tornou o 4º atacante. No confronto com o W-M, ficavam 4 zagueiros para marcar 3 atacantes, e 4 atacantes contra três zagueiros, desarticulando o esquema inglês.

Como os laterais naquela época não atacavam, exceto Nilton Santos, estes marcavam os wingers do W-M, deixando os pontas no ataque, com bastante espaço para invadir a defesa adversária. Daí a origem do termo “quarto zagueiro”, utilizado até hoje, assim como também podemos flagrar o nascimento dos ponteiros.

Desta forma, o W-M “evolui” e chegamos ao 4-2-4. A Seleção de 58, recheada de grandes craques como Nilton Santos, Didi, Pelé e Garrincha, não se apoiava só na habilidade de seus jogadores, sendo essa equipe marcada por um grau elevado de inteligência tática. Numa época em que lateral era zagueiro, Nilton Santos, o melhor lateral esquerdo da história do futebol, mudou a concepção da posição, avançando para o ataque e tornando o lateral um jogador que ataca e defende.

Para isso, Zagallo foi escalado na ponta esquerda, afinal o jogador também era outro que inovava em sua posição. Para liberar Nilton Santos sem deixar espaços, Zagallo recuava e cobria o lateral quando este avançava ao ataque. Desta feita, o Brasil tinha um lateral que atacava e um ponta que voltava fazendo a cobertura. O recuo de Zagallo tornava o 4-2-4 brasileiro diferente, afinal era montada uma linha de três no meio e outra no ataque. Nascia o 4-3-3, que ainda se demonstrava em sua forma primitiva, muito mais intuitiva e circunstancial do que algo premeditado.

Mas, a inteligência do time de 58 não ficava somente pelo lado esquerdo. Na direita, Djalma Santos ficava preso na defesa, tudo para Garrincha ficar livre para atacar, jogando apenas com a bola. Na meiuca, Zito tomava conta para que Didi chegasse mais na frente e armasse todo jogo brasileiro, como um verdadeiro maestro. Esse era o desenho tático do 4-2-4 híbrido do Brasil, afinal esta tinha uma faceta primitiva do 4-3-3:

 

 

Em 1962, no Chile, veio à transformação definitiva do 4-2-4 em 4-3-3. Nascia assim o esquema que dominaria o futebol brasileiro até o início da década de 80, influenciando toda uma geração do futebol. Telê Santana, se não me engano, antes de Zagallo, também era um ponta que recuava para compor o meio devido a sua inteligência tática, algo que ficaria perceptível mais tarde na sua brilhante carreira de treinador.

Sinceramente, tenho a curiosidade de saber se o “fio de esperança” foi a inspiração tática de Zagallo. A verdade é que tal movimentação do “velho lobo” se encaixou perfeitamente com a dinâmica e com as habilidades individuais da equipe. Esse recuo do ponta foi muito mais que uma inovação tática, proporcionando uma revolução na forma de jogar futebol. Os adversários não sabiam se marcavam o vai e vem de Nilton Santos e Zagallo pela esquerda ou à direita com Garrincha, segundo melhor jogador da história depois de Pelé.

Desta forma, o recuo de Zagallo, primeiro meia-atacante do nosso futebol, que era um ponta que compunha o meio, fazendo uma linha de três na referida faixa de campo, influenciou toda uma geração de treinadores, nascendo assim uma maior preocupação com esse setor. Descobriu-se que ter mais um atleta no meio proporcionava o aumento da posse de bola e, consequentemente, o domínio do adversário. Assim, temos um refinado desenvolvimento tático no futebol, que a cada década ia deixando seu lado primitivo, sendo lapidado por sucessivas evoluções táticas. Esse foi o desenho tático da Seleção de 62, bicampeã mundial de futebol:

 

 

Então, como citado e demonstrado no painel tático acima, na Copa de 62 a Seleção Brasileira jogou num belíssimo 4-3-3, que infelizmente não pode contar com Pelé, sendo este muito bem representado por Amarildo. Essa Copa, além de ter sido o torneio que revelou o 4-3-3 ao mundo, foi também o marco do abandono do W-M, praticamente trinta anos após sua criação. Além da supracitada inovação, esse time teve o privilégio de contar com a genialidade de Garrincha. Veja o que escreveu Sandro Moreyra, jornalista esportivo da época:

 

 “Em 1962, com a contusão de Pelé, descobriu-se um outro Garrincha. De repente parou de brincar, virou sério, compenetrado de que a conquista da Copa dependia dele. Quase sozinho, ganhou a Copa. Fez o que nunca tinha feito. Gols de cabeça, pé esquerdo, folha-seca. E driblou como um endiabrado, endoidando os adversários".

 

As atuações brilhantes de Mané produziram frases de espanto na imprensa, afinal realmente ele sobrou naquela Copa, entrando pra sempre na história dos melhores jogadores do torneio. O jornal chileno El Mercúrio, na época divulgou uma manchete que questiona a origem do jogador: Assim dizia a reportagem: “De que planeta veio Garrincha?”. Creio que a passagem de Sandro Moreyra, citada acima, foi perfeita ao descrever a importância de Garrincha na conquista do título.

Com a contusão de Pelé, o ponta direita do Botafogo assumiu a responsabilidade e se transformou, fazendo de tudo no meio e no ataque da Seleção. Além da Inteligência tática de Zagallo pela esquerda, que efetivou o uso do 4-3-3, Garrincha também executava uma função diferenciada pelo lado direito, armando as jogadas pelo centro e também afunilando pelas pontas. Como Feola adoeceu, e não pode comandar o Brasil, Aymoré Moreira assumiu e manteve a base de 58, aposta certeira para a conquista do Bicampeonato. Com a contusão do Rei, Garrincha assumiu sozinho o posto de craque, dando um ar ainda mais peculiar ao 4-3-3 verde e amarelo.

Muitas vezes, quando pensamos nas Seleções de 58 e 62, temos uma ideia de que naquela época o Brasil vencia pela qualidade técnica absurda de seus elencos. Logicamente, tal qualidade também foi fato preponderante para o êxito do futebol brasileiro, mas não podemos ignorar os avanços táticos que essas duas Seleções trouxeram para o nosso futebol, mudando a forma de jogá-lo em todo o planeta. E esse é o legado tático da Seleção de 62: mostrar ao futebol mundial o 4-3-3, numa versão ofensiva e liderada por um mágico de pernas tortas chamado Garrincha. Parabéns Seleção de 62, pelos 50 anos do Bi mundial! Que sirva de inspiração para essa Seleção atual, tão óbvia no aspecto tático. Abraço!

 

 

 

 

 

Victor Lamha de Oliveira

 

 

 

Fontes:

 

UOL – Copa do Mundo 2010 – História das Copas

https://copadomundo.uol.com.br/2010/historia-das-copas/1962-chile/frases/

 

Olho Tático – Por André Rocha

https://globoesporte.globo.com/platb/olhotatico/2011/08/23/especial-a-escola-brasileira-talento-e-compensacoes-taticas-parte-i/

 

Blog Preleção – Por Eduardo Cecconi

https://www.clicrbs.com.br/blog/jsp/default.jsp?source=DYNAMIC,blog.BlogDataServer,getBlog&uf=1&local=1&template=3948.dwt&section=Blogs&post=136771&blog=558&coldir=1&topo=3994.dwt

 

Livro “Inverting the Pyramid”, do jornalista inglês Jonathan Wilson.

 

 

Tópico: ESPECIAL 50 ANOS DO BI: O LEGADO TÁTICO DA EQUIPE DE 1962

Re:viajem tática

Victor Lamha de Oliveira | 23/06/2012

Fala Marcelo, tudo bom? Gostou do post? Eu também adorei fazê-lo, afinal é uma forma de homenagear a maior geração de futebol, em termos técnicos e táticos, da história do futebol mundial. Eu assisti na íntegra o jogo da final de 58, entre Brasil e Suécia. A narração está em inglês, mas isso é o de menos. Vale a pena ver Garrincha e Pelé jogando juntos essa final histórica. Abraço!

Saudade...

Luis Paulo | 20/06/2012

Oi Victor! Cara, adorei seu texto! Parabéns! Quanta saudade dessa época né? Pelé, Garricha, Didi, Zagallo, Nilton, Gilmar e esse inteligente 4/3/3 que partia dos jogadores e não do banco de reservas. Abç

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