O LEGADO TÁTICO DE MANO MENEZES: PARTE 4

02/05/2013 11:22

 

Nesse momento difícil vivenciado pela Seleção Brasileira, o Painel resolveu esmiuçar taticamente a Era Mano Menezes e o legado tático por ela deixado. Depois de passarmos por três etapas distintas que marcaram o trabalho de Mano, chegamos à parte principal e que no momento mais nos interessa: o que pode ser aproveitado por Felipão? O que Felipão tem o dever de não mudar? Como não jogar dois anos de trabalho tático fora? É isso que o presente texto pretende abordar, procurando fechar a série com chave de ouro. Obrigado a todos que vem seguindo o Painel nessa jornada!

 

 

Parte 1: O início promissor e as primeiras decepções

Parte 2: A Copa América e o caminho até Londres

Parte 3: Uma nova equipe após as Olimpíadas

Parte 4: O que pode ser aproveitado por Scolari

 

 

                                                                                                

O que pode ser aproveitado por Scolari

 

Quando começou a ser enxergado na Seleção um resquício de padronização tática, Mano foi, erradamente, demitido do cargo de treinador da equipe brasileira. Se teve algo que o ex-treinador canarinho fez em demasia, foi testar, ficando isso comprovado nas três partes já publicadas dessa série do Painel que muito agradou aos nossos leitores. Mano Menezes demorou a definir o esquema e testou além da conta, mas um questionamento é válido: até onde testar tanto foi prejudicial? Teriam sido tais testes necessários para que Mano chegasse ao melhor momento de seu trabalho?

 

Depois de muito testar durante dois anos, essa era a provável equipe que Mano tinha como ideal para ser finalmente padronizada. O esquema já estava escolhido e, como demonstrado na parte 3 da série, várias explicações embasam essa decisão do antigo treinador. Primeiramente, compactação e marcação em bloco. Mano percebeu a dificuldade de compactar e compor bem os espaços no 4-2-3-1, até mesmo pela falta de apego tático de Neymar, obsoleto na recomposição. Oscar, que brilhou no centro desde que chegou à Seleção, foi alocado como winger para que Kaká ficasse mais livre e posicionado de forma mais proveitosa e adequada. Mano chegou a algumas conclusões. A principal: primeiramente montar um time compacto, não só na marcação, mas que flutuasse por todo o campo, na transição defensiva e ofensiva. Para isso, independente do esquema tático, precisaria de dedicação total dos homens de meio campo. Outra conclusão certeira: Neymar tem que jogar solto, seja como ponta de lança ou então como um falso 9. Por dois motivos: não ficar encaixotado pela esquerda, principalmente contra defesas que se compactam em linhas e para não prejudicar a recomposição defensiva da linha de meio quando o time perde a bola. Liberando Neymar, potencializa-se a chance de aproveitamento da habilidade do jogador sem que se prejudique o setor defensivo. Tanto que Mano procurava para o meio jogadores com maior apego tático, liberando Kaká e Neymar para decidir. Nessa toada, Hulk ganhou a vaga e, contra a Colômbia, ao machucar e não poder jogar, foi substituído por Thiago Neves, que vinha desempenhando com qualidade a função de winger no Fluminense.

 

 

A escalação de uma linha de meio dedicada à marcação e Neymar solto para flutuar foram conclusões que Mano tirou depois de dois anos árduos de trabalho, assim como entendeu que Ronaldinho Gaúcho não poderia ser o líder técnico e tático que tanto procurava. Quando chamou Kaká, agiu diferente, não tirando a 10 de Oscar. Preferiu inserir o meia do Real como um facilitador, não como a referência do time. Outra coisa interessante desse final de trabalho do Mano foi a função dos volantes. Independentemente dos nomes convocados, estes se tornaram mais participativos no ataque, sendo também beneficiados por uma estrutura tática mais segura.

Mas, a “competente” CBF decidiu mudar. Agora comandada por um fantoche decrépito chamado José Maria Marín, resolveu a instituição máxima do nosso futebol mudar tudo, não se preocupando com o desperdício de dois anos e a continuidade de um trabalho. Para tirar a pressão de suas costas, o presidente da CBF, que tem o passado ligado aos terrores da ditadura militar, preferiu chamar uma comissão técnica de peso para que toda pressão fosse nela canalizada. Assim, no final de 2012, chegaram ao comando da Seleção Luiz Felipe Scolari, seu fiel escudeiro Murtosa e Carlos Alberto Parreira.

Com a chegada de Felipão, mais do que a lembrança do penta, o que passava na mente dos torcedores era um receio de retrocesso: concepção ultrapassada no uso de três zagueiros? A volta dos brucutus como volantes? Retranca? Entretanto, na primeira convocação Scolari foi político e não agrediu a opinião pública. Como uma “raposa em pele de cordeiro”, manteve a base de Mano na convocação, inclusive os dois volantes qualificados que agradaram ao torcedor e a imprensa. Na época, lembro que tal comportamento gerou dois sentimentos: surpresa e esperança. Felipão teria mudado?

 

Inglaterra 2 x 1 Brasil – Londres – 06 de fevereiro de 2013: agindo politicamente, e para não impactar a opinião pública, Felipão manteve os volantes técnicos de Mano. Porém, já mudou bastante coisa em sua estreia pela Seleção. Taticamente, o Brasil jogou no 4-2-3-1 e a Inglaterra no 4-1-4-1. Com pouca movimentação de R10 e Luís Fabiano, as jogadas ofensivas ficaram óbvias. Neymar, bem marcado pela esquerda, nada produziu, saindo dos pés de Oscar as poucas chances do Brasil. A marcação da Seleção na primeira etapa foi frouxa e sem qualquer compactação, cedendo muito espaço ao time inglês. Com Neymar não recompondo nada, Ramires foi obrigado a cobrir o setor, o que centralizou Paulinho e obrigou Oscar, por vezes, fazer praticamente um terceiro volante. Essa foi a demonstração inicial da visão retrógrada que Felipão tem dos volantes, declarada em entrevista na semana passada. Como percebido por André Rocha, mais importante do que os nomes é a dinâmica dos volantes, que necessita ser mais adequada aos dogmas do futebol moderno. Nessa partida, presos na cobertura de um quarteto ofensivo que pouco marcava, Paulinho e Ramires não marcaram e nem jogaram.

 

 

A Inglaterra dominava pelo centro com Gerrard livre para arquitetar as jogadas, procurando sempre abrir o jogo pelas laterais. Percebam Ronaldinho Gaúcho a frente de Luís Fabiano, quase como um centroavante, enquanto Gerrard ficava solto. Sem três jogadores não cumprindo qualquer tipo de função defensiva (Neymar, Ronaldo e Luís Fabiano), o Brasil tornou-se presa fácil para a marcação inglesa. Outro fato: a diferença de padrão tático foi gritante, além da diferença de ritmo de jogo.

 

 

Na segunda etapa, entraram Miranda, Filipe Luís, Arouca, Jean, Lucas e Fred, autor do gol brasileiro.  O jogador do Fluminense entrou bem, marcou o dele e por pouco não virou o jogo no início da segunda etapa. Taticamente, a mesma equipe. Porém com mais jovialidade e uma movimentação mais equânime. A versão mais jovem do 4-2-3-1 mostrou mais mobilidade diante do time inglês, já cansado pela correria aplicada nos 60 minutos iniciais. Mas, o Brasil pouco evoluiu sem qualquer padrão de jogo.

 

 

Além de trazer novos nomes como Dante e ressuscitar outros como Ronaldinho, Júlio César e Luís Fabiano, Scolari decidiu ignorar as linhas de Mano e voltar com o 4-2-3-1. Com outra péssima atuação, a desculpa para Ronaldinho foi uma alegada falta de ritmo por causa da temporada brasileira, que ainda se iniciava. Entretanto, poucos dias depois, o “dentuço" quase fez chover em jogo da Libertadores. Parece que sua versão “Sonaldinho” é reservada para os jogos da Seleção. Felipão reclamou muito do posicionamento do time, prometendo mudanças e a volta de um primeiro volante marcador para o jogo contra a Itália.

 

Brasil 2 x 2 Itália – Genebra (Suíça) – 21 de março de 2013: nos treinamentos táticos realizados antes do jogo, Felipão testou o 4-2-3-1 agudo pela esquerda com Neymar  e o 3-5-2 como opções de escalação. No final acabou optando por um 4-4-1-1 (também pode ser classificado como um 4-4-2 britânico, afinal Neymar e Fred jogavam soltos) utilizando Neymar flutuando como ponta de lança e guarnecido por uma linha de quatro. Fernando ficou plantado como referência à frente da defesa, formando por vezes no campo um 4-1-4-1 com o craque do Santos compondo a linha. Usando uma equipe muito parecida com a deixada por Mano Menezes, Scolari conseguiu fazer dois gols em cima do 4-3-1-2 de Prandelli na primeira etapa. O comandante brasileiro teve o mérito de colocar Neymar para jogar em cima de Pirlo, o que tirou do italiano a possibilidade de pensar o jogo. O Brasil iniciou com Hulk pela direita e Oscar pela esquerda, mas como De Rossi marcava melhor que Montolivo, Felipão, aos 18 minutos, inverteu as posições e colocou Oscar pela direita, onde o jogador encontrou mais espaço. Com gols de Fred e Oscar, a Seleção fez grande primeiro tempo.

 

 

Como citado acima, por vezes Hernanes avançava e Neymar recuava na composição de espaços, ficando Fernando como referência defensiva do meio de campo e Fred como referência ofensiva no campo de defesa italiano. A dinâmica tática se mostrou interessante e Neymar surpreendeu pela maior dedicação ao jogo coletivo.

 

 

Transição ofensiva do Brasil: com Filipe Luís mais preso, Daniel aproveitava o winger direito bem aberto para habitar mais o meio de campo. Hernanes assumia a criação das jogadas e Neymar aproximava de Fred como um típico segundo atacante. Percebam que, de forma inteligente, Neymar foi posicionado às costas de Pirlo.

 

 

Transição ofensiva da Itália: enquanto o Brasil marcava em duas linhas, com Neymar e Fred mais soltos para aplicação do contragolpe, a Itália avançava o losango desenhado pelo meio e invertia suas posições para Pirlo poder assumir a criação e pensar o jogo mais perto da área.

 

 

Prandelli mudou a cara do jogo com duas substituições no intervalo e encurralou o time brasileiro. As saídas de Pirlo e Osvaldo, e as entradas de Cerci e El Shaarawy, acabaram amarrando os laterais do Brasil, empurrando os volantes canarinhos para trás e deixando os homens de frente isolados, impossibilitando, assim, a transição ofensiva. Scolari substituiu mal ao tirar Oscar e Fred, colocando Kaká e Diego Costa. Outro equívoco: Felipão prendeu demais Hernanes, que não marcava e nem conseguia aproximar-se do ataque. O Brasil tomou dois gols e por pouco não levou a virada. A equipe brasileira perdeu grande chance de vencer uma seleção campeã mundial, lembrando que a última vitória desse quilate foi contra a Inglaterra em 2009.

Apesar do empate, que para o Brasil teve sabor de decepção, o resultado não foi ruim, afinal a Itália tem um trabalho de três anos e vem jogando bem, sobretudo nas Eliminatórias. Ficou claro que no segundo tempo faltou ao time brasileiro o entrosamento necessário para se redesenhar taticamente após uma reviravolta estratégica e tática do oponente. No post que fiz para o jogo, ressaltei a diferença entre Prandelli e Felipão quando o assunto são volantes habilidosos. Abaixo a citação do referido texto publicado no post “Brasil 2 x 2 Itália: Scolari escala o Brasil com dois atacantes e fica no empate”:

 

- O interessante é que Prandelli vem na direção contrária de Felipão. Treinador da Azzurra desde 2010, após o fracasso na Copa africana, o comandante italiano sofreu críticas no início de seu trabalho por montar seu meio de campo com volantes de passe qualificado e boa leitura de jogo, mas com menor poder de marcação, o que causou reclamação no sentido de que faltava a “pegada” comum aos times italianos na meia cancha. Prandelli sempre gostou de times organizados e aplicados taticamente, privilegiando um bom toque de bola. Os tempos de cautela, em que a Itália entrava em campo apenas para marcar forte e tentar a sorte no contragolpe, ficaram para trás. Sob o comando de Cesare, o time passou a valorizar meio-campistas habilidosos e que buscam o ataque. Suas convocações comprovam isso, assim como suas várias alternativas táticas para aumentar o volume de jogo ofensivo da equipe. A decisão de abrir mão dos volantes que só sabem marcar foi vista com desconfiança no começo porque contrariava uma tradição italiana de marcação cerrada pelo meio. Entretanto, hoje é aplaudida pelos torcedores e jornalistas, que têm prazer em ver um time mais técnico em campo. Para Prandelli, o próximo passo na montagem do time é fazer a equipe aprender a recuperar a bola o mais perto possível da área adversária, sem que isso a torne vulnerável a contragolpes. Já Scolari vem caminhando em sentido contrário as tradições do futebol brasileiro. Após Mano ter deixado o cargo com dois volantes técnicos à frente da zaga, o que era solicitado há tempos por imprensa e torcida, Felipão colocou como primordial o uso de volantes que marquem mais, chegando a testar Fernando e Luiz Gustavo juntos no primeiro treino tático da semana.

 

Chamou atenção o péssimo desempenho de Kaká jogando aberto pela beirada. Atordoado com as subidas do lateral e um ponteiro às suas costas, o meia do Real Madrid pouco conseguiu chegar até a intermediária para criar. Talvez por isso, novamente Scolari mudou contra o time russo, voltando ao obsoleto 4-2-3-1 com Neymar pela esquerda e Kaká pelo centro. A opção não foi a melhor escolha, o que acabou se refletindo numa fraca atuação do time brasileiro, que conseguiu o empate com Fred na base da pressão e após Hulk entrar e forçar o jogo pelo flanco esquerdo.

 

Brasil 1 x 1 Rússia – Londres – 25 de março de 2013: a Seleção foi mal em Londres. Um dos motivos foi a volta do 4-2-3-1 sem movimentação, o que significou o abandono das linhas de meio. Entretanto, os problemas vão além do desenho tático, com bem colocado por André Rocha em texto sobre o jogo: “O problema está no posicionamento e na dinâmica. De todo o time, que precisa participar mais sem a bola. Júlio César não pode trabalhar tanto. A volta ao 4-2-3-1 com movimentação de Kaká, Oscar e Neymar atrás de Fred, em tese, poderia ser interessante. Mas a execução não ajudou. Em vários momentos, quem se apresentava para armar as jogadas era Daniel Alves, que errava passes em profusão. Neymar também contribuiu pouco, mesmo circulando por todos os setores do ataque ao longo dos 90 minutos”. Mais uma vez o time do Brasil sofreu devido a sua marcação desorganizada e a total falta de compactação. Já a equipe russa, muito bem treinada por Capello e postada num híbrido 4-3-3/4-1-4-1, conseguia compactar em todos os setores, o que dificultava as ações ofensivas do previsível time brasileiro. Mais uma observação relevante de André Rocha: “A curiosidade: a equipe russa, bem mais entrosada, atuou agrupada e procurou trabalhar com passes curtos, sem maiores riscos. Já a seleção brasileira, em busca da melhor formação e do sistema de jogo mais adequado, sofreu com os setores espaçados e as muitas inversões de jogo e passes longos que quase invariavelmente caíam nos pés dos oponentes”.

 

 

O gol russo marcado por Fayzulin foi emblemático: após uma linha de passe de pelada na área brasileira, com a defesa perdida e marcando a bola, os russos fuzilaram até um soldado ficar livre para a conclusão final. André Rocha classificou o tento como “gol de várzea”. E as observações do comandante do Olho Tático foram precisas sobre as alterações e o gol de empate brasileiro: “Na única jogada bem construída coletivamente do time de Luiz Felipe Scolari no Stamford Bridge, Hulk acertou belo passe na ultrapassagem para Marcelo, que serviu Fred. Terceiro gol do centroavante em três jogos na nova Era Felipão. Com Diego Costa e Hulk nas vagas de Oscar e Kaká, curiosamente a seleção não apelou para as jogadas aéreas. Mesmo com dois centroavantes. Foi difícil também entender o posicionamento de Neymar à direita e Hulk pela esquerda, já que ambos funcionam melhor do lado oposto. Na prática, porém, Hulk mostrou sintonia fina com Marcelo, o melhor brasileiro em campo, e a dupla criou a jogada do gol “salvador”. Impressiona a eficiência de Fred. Mas mesmo o camisa nove pode e deve ser mais participativo”.

 

 

Ter empatado com Itália e Rússia, duas grandes seleções do atual futebol europeu, não foi nenhum demérito. O problema foi o Brasil ter jogado mal coletivamente, de forma espaçada e com muitas dificuldades para se compactar na transição defensiva e ofensiva. Curiosamente, a Seleção jogou melhor quando se valeu do 4-4-2 britânico e o usou com mais apego tático.  Tal desenho foi usado no primeiro tempo contra a Itália e nos trinta minutos finais contra o time russo. Depois dos amistosos pela Europa, Felipão teve dois duelos contra Bolívia e Chile, podendo convocar somente jogadores que atuam no Brasil.

 

Bolívia 0 x 4 Brasil – Santa Cruz de La Sierra (Bolívia) – 06 de abril de 2013: em amistoso beneficente, devido a morte do garoto Kevin Espada na Libertadores, apenas jogadores brasileiros foram convocados e assistimos em campo um ritmo mais de pelada do que propriamente de um jogo profissional entre seleções. Com muito espaço, devido a péssima marcação dos bolivianos, Ronaldinho e Neymar brilharam. Porém, era sabido que o êxito e a goleada não podiam ser parâmetros de avaliação por causa da fragilidade absurda do adversário. Taticamente, Felipão montou sua equipe num 4-2-3-1 torto, agudo pela esquerda com Neymar de segundo atacante e Jadson fazendo a dupla função de meia extremo (na transição ofensiva) e volante (na transição defensiva). Esse 4-2-3-1 com dinâmica de 4-3-1-2 era esperado até mesmo no time principal, sendo a única possibilidade tática plausível caso Felipão resolva escalar Neymar, Ronaldinho e mais um centroavante.

 

 

Brasil 2 x 2 Chile – Mineirão (Belo Horizonte) – 24 de abril de 2013: no primeiro jogo da Seleção após a reforma do Mineirão para a Copa do Mundo, muitas vaias, xingamentos para Neymar e um grito de olé humilhante, evidenciando uma indignação total do torcedor. Não ignorando a falta de treinamento e de padrão tático, fica difícil não enxergar o “banho estratégico” que Jorge Sampaoli deu no óbvio Felipão. O híbrido 3-4-3/4-3-3 chileno foi montado para encaixar no previsível e apático 4-2-3-1 brasileiro. Rojas era o responsável por marcar Damião, ficando Alvarez preso pela direita para cuidar de Neymar. Pela esquerda, Mena era o responsável pela hibridação do esquema, ora como um lateral e em outras oportunidades compondo uma linha de meio e desenhando em campo o 3-4-3 (além de cuidar de Jadson). Reyes tomava conta de Ronaldinho, o que propiciava ao time chileno sempre ter uma sobra com González. Percebam que Damião, Neymar e Ronaldinho estão circulados de vermelho. O motivo: destacar os três atletas brasileiros que não jogavam sem a bola, praticamente abandonando a transição defensiva, o que proporcionava superioridade numérica dos chilenos em todos os setores do gramado.

 

 

Apesar do temor do torcedor brasileiro, nos próximos amistosos contra Inglaterra e França, ambos em junho e no Brasil, assim como na Copa das Confederações, não deve a Seleção atuar nesse 4-2-3-1 com Neymar pela esquerda. No Bate bola 2ª Edição do dia 08/04/2013, Parreira afirmou que existe um consenso na comissão técnica quanto ao posicionamento tático do craque do Santos. Declarou que o jogador tem que atuar mais livre atrás do centroavante, possuindo liberdade para atuar por todo o campo.

Para fundamentar a opção tática, completou dizendo que “prender Neymar pela esquerda não é a melhor opção para o time do Brasil”. Assim, já está definido pela comissão técnica o uso de Neymar livre como segundo atacante e um centroavante mais fixo. Nesse contexto, Felipão e Parreira passam a ter duas opções táticas: escalar um 4-2-3-1 torto com dinâmica de 4-3-1-2 ou dispor o escrete canarinho num 4-4-2 britânico, com duas linhas de marcação.

 

Acima as duas opções de Luiz Felipe Scolari para jogar com Neymar mais solto: na letra A um 4-2-3-1 torto, com Neymar mais atacante pela esquerda, Ronaldinho ou Kaká pelo centro e o outro meia pela direita fazendo uma espécie de terceiro volante na transição defensiva. Na letra B aquilo que Mano decidiu fazer após dois anos testando, que é Neymar e mais um jogador livres pelo ataque e guarnecidos por uma linha de quatro. O problema é que Felipão, de acordo com o andamento do seu trabalho, optou jogar com uma referência técnica e tática no meio, tanto que lançou a disputa entre Kaká e Ronaldinho. Com Neymar livre, um centroavante e mais Ronaldo ou Kaká, fica praticamente definido o 4-2-3-1 com dinâmica de 4-3-1-2, indo contra aquilo que Mano deixou como legado. O próprio Scolari sabe que jogar com uma linha de meio, num 4-4-1-1, com Neymar solto atrás dos centroavantes, não combina com a escalação de Kaká ou Ronaldo, jogadores que não fazem a recomposição defensiva da linha de meio. Tanto que nos melhores 45 minutos de Felipão nesses cinco jogos, que foi o primeiro tempo contra a Itália, Kaká ficou no banco e o time jogou bem no 4-4-1-1. Na segunda etapa, o meia do Real Madrid entrou na vaga de Oscar, aberto pelo lado. Pouco produziu ofensivamente e muito menos foi útil na marcação, tanto que contra a Rússia, voltou o time brasileiro ao 4-2-3-1 com o meia merengue centralizado, assim como tinha jogado Ronaldinho contra a Inglaterra.

 

 

Chegando ao fim da série sobre o legado tático deixado por Mano Menezes, algumas lições foram deixadas pelo ex-treinador, o que não deve ser ignorado por Scolari, sendo mais plausível a continuidade do trabalho. Depois de dois anos testando, Mano descobriu algumas verdades táticas e técnicas que deveriam fazer parte do planejamento estratégico da Seleção. Será um equívoco fechar os olhos para as lições aprendidas e apostar no início de um trabalho inteiramente novo com praticamente um ano para o início da Copa. Abaixo, aquilo que Mano nos deixou como legado:

 

1) A primeira grande lição se refere ao posicionamento de Neymar. Insistir nesse 4-2-3-1, com Neymar pela esquerda, é prejudicial em dois aspectos: o primeiro é perder a movimentação do melhor jogador do time, sendo hoje aquele com o maior poder de decisão entre os homens de frente. E também fica prejudicada a transição defensiva, visto que Neymar não recompõe com qualidade. Assim, criam-se uma série de compensações táticas para que o craque jogue pela esquerda e não marque, o que requer ainda mais tempo de treinamento para que o time consiga compactar e marcar a saída de bola do adversário. Sobre o assunto, Mano não tinha mais qualquer dúvida: Neymar, na Seleção, somente livre para decidir. Seja como falso 9 ou então como ponta de lança atrás de um centroavante;

 

2) Para utilizar Ronaldinho ou Kaká, segue a mesma lógica aplicada para Neymar: somente livre com o craque do Santos na frente e guarnecidos por uma linha de meio. Ou seja, para jogar com um dos dois meias e Neymar, teria o técnico da Seleção que abrir mão do centroavante de área, evitando que o Brasil fique sem a participação de três atletas na transição defensiva. A opção mais correta, de acordo com o que Ronaldo e Kaká vêm jogando com a camisa do Brasil, é abrir mão dos dois e lançar o Brasil com Neymar solto e mais um atacante. Também, acompanhando o raciocínio tático, seria ideal a montagem de uma linha de meio forte, jovem e veloz na marcação. Agora, se for utilizar a referência técnica no time e não quiser perder consistência defensiva, terá que abrir mão do camisa 9.

 

3) Ronaldinho Gaúcho encerrou seu ciclo na Seleção Brasileira. A última grande partida do jogador com a amarelinha foi na goleada de 4 x 1 em cima da Argentina na final da Copa das Confederações de 2005. De lá pra cá, incluindo a Copa de 2006, aonde chegou como melhor jogador do mundo, foram apenas fiascos e atuações sonolentas. E oportunidades não faltaram. Após a péssima atuação na Copa da Alemanha, teve chances com Dunga no time principal e nada jogou. Foi levado para as Olimpíadas de 2008 e teve outra participação bem abaixo. Ficou de forma justa fora da Copa de 2010 e não aproveitou nenhuma das oportunidades que teve com Mano, continuando a jogar mal nas chances que, até agora, teve com Felipão. Tanto que Mano já tinha abandonado o dentuço e se decidido por Kaká, jogador que se adequa mais a jovialidade e a velocidade do leve e jovem time brasileiro. Se Kaká não estiver bem, que Felipão não leve nenhum dos dois. E Ronaldo: sem chance!

 

4) Velocidade, no futebol moderno, não é correr com a bola, mas fazê-la correr. Toques rápidos propiciam ao time ter mais espaços e aumentar o volume de jogo ofensivo, assim como estar mais próximo para agrupar-se na transição defensiva. A última e importantíssima lição deixada por Mano é que, o ideal para a equipe brasileira, que não disputou as Eliminatórias, é se fechar em linhas de quatro bem definidas e fazer um uso mais produtivo dos volantes na transição ofensiva. Mais do que convocar e escalar volantes técnicos, é preciso implementar em suas participações uma atuação eficaz no ataque, como fazem os volantes da Alemanha, da Espanha, da Itália, da Inglaterra, do Barcelona, do Real Madrid, do Borussia e do Bayern de Munique, traço marcante nas melhores equipes do futebol mundial.

 

Time mais adequado ao legado tático deixado por Mano, o que propicia uma continuidade inteligente do trabalho e não um rompimento total de paradigma. A tática seria o 4-4-1-1 com Neymar de ponta de lança e um centroavante mais a frente. Caso queria usar Kaká (ou até mesmo Ronaldinho), o ideal para não fragilizar o setor defensivo é abrir mão do camisa 9 e colocar Neymar como referência no ataque. Nas beiradas, Hulk e Oscar merecem ficar com as vagas, acompanhados de perto por Lucas, que espera a oportunidade. Na cabeça de área, um volante mais marcador (e qualificado para sair com a bola) e outro que encoste nos homens de frente com mais freqüência e qualidade, sempre mantendo a preocupação de compactar a linha na transição defensiva. Com esse esquema e esses nomes, Felipão devia aproveitar o legado tático de Mano Menezes e alterar alguns detalhes que dariam ao time um pouco mais de seus valores (como a objetividade, por exemplo).

 

 

Dois detalhes antes de encerrar: Felipão foi sagaz em 2002 ao aproveitar a base deixada por Luxemburgo, apenas fazendo algumas adequações táticas e técnicas. Não ter desperdiçado o trabalho de Luxa foi fundamental. E Parreira em 94, sabendo da inferioridade do Brasil, tanto tática quanto técnica, lançou uma marcação em linhas eficaz e moderna para a época, aproveitando os volantes de forma inteligente para auxiliar na transição ofensiva. A Seleção do tetra foi contestada pelo futebol pragmático, mas trouxe o caneco depois de 24 anos sem título.

O próximo texto que abordará o tema Seleção Brasileira irá tratar da contestada entrevista de Felipão sobre os volantes, aprofundando na importância dos mesmos na moderna concepção tática do futebol, independentemente do esquema utilizado. Agradeço a todos os leitores pela participação e pelos elogios que venho recebendo desde a publicação do primeiro texto da série. Agora é aguardar os próximos amistosos e a Copa das Confederações. Abraço!

 

 

https://www.espn.com.br/post/318793_novo-empate-nao-pode-mascarar-a-fraca-atuacao-da-selecao-brasileira

 

https://paineltatico.webnode.com/news/brasil-2-x-2-italia-scolari-escala-o-brasil-com-dois-atacantes-e-fica-no-empate/

 

https://paineltatico.webnode.com/news/inglaterra-2-x-1-brasil-scolari-estreia-com-derrota/

 

https://www.espn.com.br/post/321319_ronaldinho-e-neymar-as-observacoes-possiveis-na-quase-inutil-goleada-da-selecao

 

https://taticamentefalando.blogspot.com.br/2013/04/brasil-2x2-chile-o-baile-tatico-de.html

 

https://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=QGbpfusje6M

 

 

 

 

Victor Lamha de Oliveira

 

Tópico: O LEGADO TÁTICO DE MANO MENEZES: PARTE 4

futebol

Fabiano hungaro | 03/05/2013

Eu creio que esse 4 2 3 1 , não é posicionamento ideal para a seleção , Oscar tem que ser titular , mas não pelas laterais do campo ele não tem velocidade e sim classe no toque de bola se for com lucas ae tudo bem , com ele no meio e chega pelo amor de DEUS de Kaká , Ronaldinho , precisamos renovar e tempo foi perdido pra isso , claro que torso pra vencermos a copa , mas esse sonho é distante , infelizmente Alemanha , Espanha, Holanda, Itália, Bélgica, estão na nossa frente.

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